Hebreus 10. 19-25
O
conteúdo da carta aos Hebreus é dividido em duas partes principais: a) doutrinária;
b) prática ou pastoral. O autor expõe na parte doutrinária que Cristo é o clímax
da revelação de Deus (1.1-3); a sua superioridade em relação aos anjos, Moisés,
sacerdócio Levítico (1-11); explicação sobre a tipificação e simbolismo das
cerimonias no Antigo Testamento, como sombra do que haveria de vir, Cristo (10.
1-18) e que Cristo é sumo-sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque. A segunda
parte ele aborda de modo prático como os crentes hebreus deveriam viver a luz
dessas verdades doutrinárias. O autor exorta a Igreja não agir como os
apostatas (6. 1-12); a não cometerem o mesmo erro que o povo de Israel cometeu
no passado rebelando contra o Senhor e apostatando da fé (10.26-31); exorta
esses hebreus ao progresso na Fé como fizeram os homens e mulheres de Deus no
Antigo Testamento, sempre olhando para o consumador e autor da nossa fé, Cristo
(11-12); perseguir a santidade (12. 14-17); deveres Sociais e amor fraternal
(13. 1-6) e deveres espirituais em relação aos pastores (13. 7-17).
É
nesse contexto doutrinário e pastoral que o autor exorta os leitores originais
e também a nós, a não deixar de congregar, como era o costume de alguns. Mas
antes de expor propriamente o texto que originou o tema desse artigo, é preciso
que exponha rapidamente os versos imediatamente anteriores a passagem. O autor
usa muitas figuras do Antigo Testamento para mostrar aos seus leitores
originais, que eram hebreus convertidos, que esses ritos, cerimonias,
sacerdócios em Israel, eram sombra de Cristo! Ele falou sobre a ineficácia dos
ritos e leis cerimonias do Antigo Testamento
Ora, visto que a lei tem sombra dos
bens vindouros, não a imagem real das cousas, nunca jamais pode tornar
perfeitos os ofertantes, com os mesmos sacrifícios que, ano após ano,
perpetuamente eles oferecem.
(10.1)
Os
sacrifícios diários e anuais em Israel nunca foram exigidos por Deus como uma
forma permanente de purificação de pecados. Mas serviam para apontar para a
morte sacrificial de Cristo, que de uma vez por todas cancelaria o escrito de
dívida que pesava sobre nós (Cl 2. 13-15). O autor reafirma essa verdade ao
dizer:
Entretanto, nesses sacrifícios
faz-se recordação de pecados todos os anos, porque é impossível que o sangue de
touros e de bodes remova pecados.
(10. 3-4)
Os
sacerdotes apresentam sacrifício diariamente, todavia, Cristo como sumo
sacerdote e a própria oferta, apresentou-se perante o Senhor nos Santos dos
Santos de uma vez por todas (10. 11-18). Através de Cristo e pelos seus méritos
expiatórios, temos livre acesso a presença do Pai:
Tendo, pois, irmãos, intrepidez
para entrar no Santo dos Santos, pelo sangue de Jesus,
(10.19)
O
autor está dizendo a esses irmãos hebreus que em Cristo todos os ritos
cerimoniais no tabernáculo e depois no templo, se cumprem. Em Cristo temos
acesso a presença do Pai, porque Ele é o Novo e Vivo Caminho! Como o próprio
Jesus afirmou aos discípulos, que Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida e ninguém
pode ir ao Pai senão por ele (Jo 14.6). Devemos entrar na presença de Deus com
ousadia, intrepidez, confiados nos méritos de Cristo, porque ele é o nosso
Mediador (1 Tm 2.5), o nosso Advogado Justo (1Jo 2.1-3); e a nossa justificação
(Rm 5.1)! O véu foi rasgado de uma vez por todas! A carne de Cristo era
tipificada pelo véu no templo! Quando Cristo morreu na cruz, é dito que o véu
do templo rasgou de alto a baixo (Mt 27. 51-53).
Não
existe mais necessidade de sumo sacerdotes, temos um único Sumo sacerdote que
nos representa na presença do Pai, para sempre! O Senhor Jesus é o grande sumo
sacerdote na Casa de Deus (10. 21-22). O sacerdócio levítico apontava para
Jesus (7. 4-19). Os sumos- sacerdotes da casa de Arão, apontavam para o Sumo
Sacerdote segundo a Ordem de Melquisedeque (7. 1-3). Para ele tudo converge, se
cumpre! Por isso, devemos entrar com coração sincero e plena certeza de fé na
presença do Senhor (10. 23)! A convicção de fé envolve crer em tudo que a
Escritura testemunha sobre Jesus. O coração sincero é de alguém que foi
alcançado pela graça.
A NECESSIDADE DE CONGREGAR
Consideremo-nos também uns aos outros, para nos
estimularmos ao amor e às boas obras.
(10. 24)
O
autor exorta esses crentes a congregar, considerando um aos outros, para que
mutuamente ocorra o estimulo espiritual para a caminhada. A comunhão da igreja
é além de outros fatores, uma forma de estimulo espiritual. O amor é
estimulado, e a santidade é desenvolvida como maior intensidade. A relação
social na comunidade cristã exerce sobre nós o aperfeiçoamento na fé!
Não deixemos de congregar-nos como
é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais quanto vedes que
o Dia se aproxima.
(10. 25)
Porque
o autor fala para não deixar de congregar? Porque alguns haviam deixado: a) muitos
haviam abandonado a fé e a igreja (6. 4-8); b) retrocederam na fé, voltando a
práticas judaicas já cumpridas em Cristo (10. 32-39); c) muitos que estavam
congregando estavam com as mãos descaídas, joelhos trôpegos e profundamente
desanimados na fé (12. 12-13). Logo, esses irmãos deveriam se firmar na esperança da Volta de Cristo, que virá para
buscar o seu povo, e não os apostatas ou desigrejados! O termo “desigrejado” é
moderno, apenas uso para contextualizar a mensagem a nossa realidade que
essencialmente é a mesma do autor. Não quero dizer com isso que desigrejados
não serão salvos porque estão fora da igreja. A igreja não salva ninguém,
muitos que estão na igreja não serão salvos, porque nunca conheceram realmente
o Evangelho! É verdade que muitos desigrejados em nossos dias estão nesse
estado por uma frustração com pastores da Teologia da Prosperidade, por problemas
de relacionamentos com outros membros da igreja, e por total imaturidade
espiritual e ignorância bíblica, por nunca terem conhecido ministérios pastorais
sérios e bíblicos, acham que todas as igrejas e pastores são hereges. Para
esses, falta conhecimento e maturidade cristã. Contudo, muitos que são
desigrejados por que abandonaram deliberadamente a vida em comunidade, a
batalha da igreja, demonstram com isso, nunca terem conhecido realmente o
Evangelho! Porque alguém que conhece o Evangelho e o Supremo Pastor da igreja,
anseia fazer parte do povo em adoração e serviço. Não existe mensagem na Bíblia
para desigrejados, só existe para “igrejados”! O culto na vida diária e
individua, leva o crente a participar do
culto coletivo com o povo de Deus! É completamente incoerente que alguém afirme
ser um verdadeiro adorador e não deseje intensamente adorar juntamente com o
povo de Deus e ser pastoreado por pastores fiéis que expressem o pastoreio de
Cristo (Hb 13. 7-9).
A
Vinda do Supremo Pastor está próxima, e devemos nos exortar mutuamente para que
vigiemos e perseveremos nessa esperança. Quem não congrega, não pode ser
exortado a vigilância e santidade, pois vive no individualismo e egoísmo,
disfarçado de piedade! Talvez seja essa uma das maiores razões para a
existência de desigrejados, a arrogância e prepotência, que o impede de viver
em comunidade, ser orientado pastoralmente, submeter-se a uma liderança bíblica
(Hb 13. 7-17) e ser instruído pelo convívio bom e as vezes conflitantes com os
demais membros da igreja!
A
vida fora da comunidade cristã, da comunhão dos santos, estimula a prática de
pecados (10. 26-27): Porque, se vivermos deliberadamente em
pecado, depois de termos recebido o pleno conhecimento da verdade, já não resta
sacrifício pelos pecados; pelo contrário, certa expectação horrível de juízo e
fogo vingador prestes a consumir os adversários. A razão é simples, quando
estamos em comunhão com os santos em Cristo, somos exortados por Deus através
de pregações fiéis, exortados por irmãos piedosos, confrontados com o bom
exemplo de muitos irmãos, tudo isso nos estimula a buscar o Reino de Deus e sua
justiça (Mt 6.33). Todavia, quando estamos distantes da igreja, somos mais suscetíveis
as tentações da carne, do mundo e do Diabo. O curso natural é afastar-se
progressivamente da santidade e cometer vários pecados que começam a ser
justificados na mente como normais e que os que a igreja prega contra é fruto
de religiosidade e legalismo. Não discordo que na igreja existem práticas
proibidas que não são proibidas por Deus, fruto de tradição e costumes errados,
mas é também verdade que na igreja fiel a Escritura, somos exortados
constantemente a santidade!
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Temos
livre acesso a presença do Pai, pelo novo e vivo Caminho, Cristo! Devemos
entrar diariamente em oração, por meio do nosso Mediador! Precisamos perseverar
até o fim, crendo em todas as promessas redentoras de Deus, feitas a nós! Corramos
com perseverança a carreira que nos está proposta, olhando firmemente para o
autor e Consumador da nossa fé, Cristo (12. 1-3)! Sem, contudo, deixar de
servir a Cristo na comunhão dos santos.
Aprendemos
com esse texto que é na comunhão da igreja que nos estimulamos na fé
na esperança! É na comunhão da Igreja que nos exortamos a viver em santidade! É
na comunhão da Igreja que amadurecemos na fé! A igreja não é perfeita, é
composta de pecadores salvos pela graça, mas se fosse perfeita, deixaria de ser
quando você entrasse para adorar!
Viver
isoladamente, é uma clara evidência de falta de piedade, e talvez de conversão!
O crente verdadeiro anseia e se alegra por estar com o povo de Deus! O crente
verdadeiro usa seus dons para edificar o outro! O crente verdadeiro compreende
as falhas da igreja e luta em oração para que ocorra arrependimento e
quebrantamento da mesma! O crente verdadeiro clama a Deus para fortalecer a
Igreja! O verdadeiro adorador anseia pelo Dia que congregará com uma multidão incontável
perante aquele que está no trono e ao Cordeiro, na Nova Jerusalém (Ap 7. 9-17)!
A Ele toda a glória, hoje e sempre! Amém.
Reverendo Márcio Willian Chaveiro